quinta-feira, 26 de março de 2015

Mãe de Verdade


 Desde bem cedo, quando ainda tentava entender "de onde vinham os bebês", ouvi uma frase que nunca mais esqueci, a frase era a seguinte: "A mãe de verdade é aquela que passa pela experiência do parto normal", a mulher autora desta frase é mãe de quatro filhos, todos eles de parto normal, uma linda, guerreira e que na sua simplicidade traz um pouco da história de sua vida nesta frase…se olharmos de forma isolada, fora do contexto em que foi dita, a frase pode ser interpretada como acusatória para aquelas mulheres que não tiveram seus filhos por parto normal, mas não foi esta a intenção de quem a disse.
Bom, na época eu era uma menina entrando na adolescência e essa frase me assustou, e sempre quando pensava na maternidade lembrava dela, imagina só ter que vivenciar aquela experiência terrível representada nas novelas e filmes onde as mulheres se contorciam desesperadamente e gritavam de forma aterrorizante durante o trabalho parto. Não, definitivamente, aquela não me parecia uma boa idéia, até porque eu podia contar com o parto cesárea quando precisasse escolher, e pensando bem, se esta era a condição para ser uma "mãe de verdade", então pensei que ser uma mãe de "mentira" poderia ser mais interessante…
Bom, isso aconteceu ha pelo menos 25 anos e nessa época "ser mãe de verdade" não fazia parte dos meus planos e, sinceramente, eu ainda não tinha condições de dar sentido a esta frase.
O tempo passou, e nesses anos conheci muitas mulheres tentando, cada uma a sua maneira, ser a tal "mãe de verdade". O contato com essas mulheres me ajudou a dar sentido aquilo que no início era uma frase vazia e ao mesmo tempo assustadora. Algumas delas tentaram o parto normal e conseguiram enquanto outras não, algumas optaram ou deixaram que optassem por elas pelo parto cesárea, conheci também mulheres que eram mães sem nunca terem gerado um bebê, eram mães adotivas, mães de seus enteados, seus sobrinhos e até em alguns momentos precisaram ser "mães" de seus pais, quando esses precisaram de cuidados. Conheci também alguns homens, pais, que também puderam desempenhar este papel.
E aí eu já começava a desmontar aquilo que haviam me dito tão cedo, até que percebi que não ha a tal mãe de verdade e sim "pessoas de verdade" que aninham, olham e amam.
Desconfio que a tal frase possa ter me motivado desde cedo a pensar sobre o tema da maternidade, a questionar e observar… pois sempre me interessei em estudar o desenvolvimento humano, e no curso de psicologia tive a oportunidade de responder muitas perguntas e questionar ainda mais. Afinal, o que é uma "mãe de verdade?".
Minha inquietação diminuiu um pouco quando tive contato com o pensamento do pediatra e psicanalista inglês Donald Woods Winnicott, em sua obra ele cita a "mãe suficientemente boa", aquela que dá ao bebê o que ele necessita, nem mais, nem menos.
E como isso é possível? Será que é o parto normal o responsável por esse equilíbrio perfeito que faz de uma mulher a mãe ideal?
Sei sobre os inúmeros benefícios do parto normal, defendo, sou muito a favor (quando esse é o desejo da mulher) e acredito de verdade que esta é uma ótima forma de chegar ao mundo, mas acredito também que o parto normal não é garantia, não é o advento biológico que faz de uma mulher uma "mãe de verdade"e sim o sentido que ela dá a experiência da maternidade como um todo.
Este é um passo importante, mas não é nem de longe o principal para que o vínculo mãe-bebê ocorra, são muitas as variáveis para que tudo corra bem.
Entendo, neste momento, que a tal "mãe de verdade" não é necessariamente a que pari, nem a que cria, nem a que alimenta…é aquela que tem disponibilidade interna para acolher, amar, errar, buscar acertar e que se permite aprender a cada nova experiência, a cada novo desafio nessa jornada que é tornar-se mãe.
A mulher que me falou a frase que citei no início do texto perdeu sua mãe muito cedo, ainda criança, e para ela a mãe de verdade foi aquela que pariu, mas infelizmente, não teve muito tempo para lhe dar muito mais do que a vida, respeito sua frase e sua dor, e o sentido que ela dá ao seu pensamento, que não tem a ver com discriminação mas sim, com sua história.
Esta frase me motivou, inquietou e marcou minha vida.











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